O que declama a sua beleza
é a mesma voz que lhe atormenta
ao ser desprezado.
É o ruído do véu cinza transparente
que tremula ao toque alheio.
Este manto são só palavras
que perfuram o crânio
nas madrugadas do insone.
O tecido é indestrutível,
mas a voz, quando não ouvida,
parece calar-se.
Contemple o silêncio que brada
quem veste o véu.
Respire.
O que você procura é o grão de areia no Índico
A gota no curso de um ribeiro
O som e a fúria da queda de uma árvore num bosque
A pétala esvoaçante de uma hortênsia
A cinza fumegante do tabaco
Largue essa taça.
Não tenhas mais receio do espelho
O que vês não é o bem e o mal
(Essa simplória dicotomia)
Mas o espectro de uma palavra-sentença que nos distingue
- Eu.
Ininteligíveis não são certos poemas
A poesia de uma abstrata pintura
A melodia de uma fantaisie
Mas a dúvida...
Vazia de significados, promessa de
Significantes
Refúgio do suspeito
Resolução procrastinada
Há quem pense ser
Excitante
- Jamais poderei apreender.
Inspiração é argumento de baixa estima
vivo é o ímpeto
ao som de noturnos numa tarde quente
hedonista e lânguida
de executar aquilo que admira
expor visceralidades e paixões
ignorando (auto)crítica
Num momento de aparente inconclusão em meio à tormenta dos olhos e à exaustão ressaltada uma gravura, uma palavra, uma promessa tornam-se não produto do acaso mas recompensa de uma esperança antiga empoeirada do fundo de uma gaveta